sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A Crença no Estado

"Acontece então, inevitavelmente, que, à medida em que as pessoas vão se tornando mais estúpidas e mais descuidadas, a administração [o governo] vai se tornando mais poderosa, e vice-versa. De modo geral, as culturas que estudamos nas melancólicas páginas da história são misturas patéticas onde ainda é possível, muitas vezes, reconhecer os ingredientes que as compõe. Há sempre uma certa quantidade de funções que vivem ou sobrevivem — o pão continua a ser feito, as artes e as ciências ainda interessam a alguns poucos, etc., mas, na maior parte das vezes, observamos o fracasso de qualquer funcionamento social ativo que foi impedido, pervertido, esgotado, paternalizado e explorado por um sistema de poder e de administração que esvazia os meios e toma decisões ab extra. E o pior é que todos acreditam que se não fosse assim não haveria sociedade. Se não houvesse licenças para os casamentos nem taxas a pagar, ninguém poderia casar-se e não nasceriam crianças; se não existisse o pedágio, não haveria pontes; se não houvesse bolsas de estudos para universitários, não haveria cultura; se a usura e a Lei de Ferro dos Salários não existissem, não haveria capital; se não houvesse inflação nos preços dos medicamentos, não haveria mais pesquisa científica. E quando uma sociedade adota esse tipo de raciocínio, de que todas as atividades exigem licenças, assinaturas e a decisão de um poder abstrato, inevitavelmente acontece que qualquer homem dotado de ambição deseja o Poder, e qualquer nação luta para tornar-se o Grande Poder. E quanto maior for a ânsia de poder de alguns, mais necessário parecerá aos outros competir ou submeter-se, para que possam sobreviver — e estarão certos. Muitos se tornam cruéis e impiedosos, e outros vivem amedrontados."


GOODMAN, Paul. A Política Normal e a Psicologia do Poder. in WOODCOCK, George. Os Grandes Escritos Anarquistas. Porto Alegre: L&PM, 1981. p.87.

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