sexta-feira, 5 de março de 2010

Guerras Industriais


"— Terei entendido bem? — perguntou o professor Obnubile. — O quê! Vós, uma nação industrial, engajados em todas essas guerras!
— Claro — responde o intérprete. — São guerras industriais. Os povos que não têm comércio nem indústria não têm que fazer a guerra; mas um povo de negócios é obrigado a uma política de conquistas. O número das nossas guerras aumenta necessariamente com a nossa atividade produtora. Do momento em que uma indústria já não tenha como escoar os seus produtos, faz-se mister que uma guerra lhe abra novas demandas. Assim é que tivemos esse ano uma guerra de carvão, uma guerra de cobre e uma guerra de algodão. Na Terceira Zelândia, exterminamos dois terços da população para obrigar os restantes a comprar-nos guarda-sóis e suspensórios.
Nesse instante, um homem corpulento que estivera sentado no centro da assembléia subiu à tribuna.
— Requeiro — disse ele — uma guerra contra o governo da República de Esmeralda, que disputa insolentemente aos nossos porcos a hegemonia dos presuntos e salsichas em todos os mercados do mundo.
— Quem é aquele legislador? — perguntou o doutor Obnubile.
— É um negociante de porcos.
— Não há contestação? — disse o presidente. — Ponho a proposta em votação.
A guerra contra a República de Esmeralda foi votada a mãos levantadas por esmagadora maioria.
— Como? — disse Obnubile ao intérprete. — Os senhores votam uma guerra com tanta rapidez e com tanta indiferença?...
— Ora, é uma guerra sem importância, que não custará mais de oito milhões de dólares.
— E homens...
Os homens estão computados nos oito milhões de dólares.
Então o doutor Obnubile pôs a cabeça entre as mãos e pensou amargamente:
'Já que a riqueza e a civilização comportam tantas causas de guerra como a pobreza e a barbárie, já que a loucura e a maldade dos homens é incurável, só resta uma boa ação a cumprir. O sábio ajuntará bastante dinamite para fazer saltar este planeta. Quando ele rolar em pedaços através do espaço, um melhoramento imperceptível ter-se-á realizado no universo, e uma satisfação será dada à consciência universal, que por sinal não existe.'"

FRANCE, Anatole. A Ilha dos Pingüins. Rio de Janeiro: Ediouro, 198o. pp.128-129.

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